Leve-me ao seu Líder

25/03/2020

Silêncios

Filed under: Geral,Posts — by janainam @ 00:05

962ECCFA-2052-44F0-8BA8-DBDEA2D4D487

Silêncio de grilo no mato. Silêncio de carro passando na rua. Silêncio da casa rangendo, do gancho da rede, cachorro do vizinho que latiu.
.
Silêncio que grita, que esperneia e duvida, silêncio de esperança vazia. Silêncio agressivo, que afasta, que fecha a porta. Silêncio quente de coração ferido, silêncio frio de desdém. Silêncio que cala, que engole, entuba. Silêncio que desrespeita, que castiga. Silencio que chora, silêncio que debocha. Silêncio que é mágoa, silêncio que quer magoar. Silêncio que treme, silêncio de escuridão e desespero. Silêncio de medo e de solidão. Silêncio de fuga, silêncio de si.
.
Silêncio de quem reza. Silêncio de quem lê. Silêncio que é escuta, silêncio generoso, silêncio em prece. Silêncio paciente, de sabedoria e intuição, silêncio que espera. Silêncio que desconhece e não teme. Silêncio que observa e nada conclui. Silêncio que não sabe, porque ninguém sabe. Silêncio que desiste, silêncio que aceita.
.
Silêncio que olha. Silêncio que vê. Silêncio que aprende, curioso. Silêncio leve, de vento no rosto, de calor do sol no corpo. Silêncio que aprecia. Silêncio de quem cozinha, de quem escreve, de quem descansa. Silêncio de quem viaja. Silêncio fértil, que brota. Silêncio de todo dia, de deveres cumpridos e mente tranquila. Silêncio que entende, que perdoa. Silêncio que liberta.
.
Silêncio de grilo no mato. Silêncio de carro passando na rua. Silêncio da casa rangendo, do gancho da rede, cachorro do vizinho que latiu.

24/03/2020

De frente pra trás

Filed under: Sobre o título — by janainam @ 23:49

97FDB851-75C0-4E55-9A5C-44EA18DED647

Luz apagada, chovendo lá fora. Hoje não tem trovões nem clarão. Tem chuva tranquila, companheira. O coração, que se tornou uma visita exigente, acalmou-se. O corpo pode descansar um pouco, parar de servir o hóspede trabalhoso, que não deixou os outros moradores à vontade nesse dia longo. Agora tudo está suspenso. Pensamentos e emoções em trégua na hora parada, no escuro, acordados, olhar distante, pra dentro, além.
.
A música que toca vem dedilhada numa voz gostosa. Fala de uma sala cheia de tintas e pinturas velhas que não renovam mais o ar. Traz os discos, fica, diz a música. Eu fiquei e me fiz companhia. Não quero relaxar a ponto de dormir, não quero que acabe essa hora suspensa, não quero ainda amanhã.
.
Eu me vi.
.
Até tentei retroceder, fingir que não vi, mas a verdade, quando se instala no coração, não é discreta. E na falta de explicações ela ergue o olhar, impassível, autoritária. Eu trago versões, possibilidades, e tudo cai ao chão, diante de seu silêncio altivo. Então me vem a outra música, a que diz que eu suporto a colisão da verdade na contramão.
.
Outro réveillon.
.
Lembro do livro da Patti Smith. Ela queria sempre um réveillon especial, em que ela pensasse: que seja assim o ano todo. Certamente não desejo o mesmo. Mas desejo sim a coragem de entender a verdade. A cegueira e a covardia, por favor, não. Eu prefiro, eu aguento, eu suporto a colisão da verdade na contramão. (03/01/2020)